A indústria 4.0 da Mercedes-Benz

14/06/2018 às 9:54 - Atualizado em 03/07/2018 às 4:05

Linha a prova de erro

Mercedes-Benz é a primeira a modernizar linha de montagem com sistema 4.0 e passa a oferecer caminhões com a mesma qualidade em todas as categorias.

A fábrica da Mercedes-Benz da Vila Paulicea, em São Bernardo do Campo, SP, pode ser dita como a meca dos veículos diesel no Brasil e chegou a empregar milhares de funcionários na produção de chassis de caminhões e ônibus, estima-se algo em torno de 1,2 milhão de caminhões e 300 mil chassis de ônibus.

Houve um tempo que apenas um engenheiro alemão era responsável por toda a produção daquela fábrica – a maior do país – e ele se gabava de dizer que tinha tudo na cabeça. Logística não era um termo utilizado. No começo dos anos 80 era mágico ver como o trem motor certo chegava à linha de montagem de um andar inferior no momento exato. E correspondia exatamente ao modelo que estava sendo montado naquele  momento na linha principal. fábrica da Mercedes-Benz da Vila Paulicea, em São Bernardo do Campo, SP, pode ser dita como a meca dos veículos diesel no Brasil e chegou a empregar milhares de funcionários na produção de chassis de caminhões e ônibus, estima-se algo em torno de 1,2 milhão de caminhões e 300 mil chassis de ônibus.

Perto de 40 anos depois, as coisas estão bem diferentes. A velha fábrica ficou na lembrança e os irritantemente precisos e incansáveis robôs conectados por um moderníssimo sistema de TI tomou o lugar de muitos empregados que faziam trabalhos repetitivos, estressantes e alguns até inseguros e insalubres, com uma produtividade então inimaginável. Hoje são os robôs que possibilitam a confecção de produtos de primeira qualidade e com a mais absoluta regularidade de alta qualidade.

A partir de agora a montadora já trabalha rumo à implantação do conceito de indústria 4.0, a conhecida quarta revolução industrial, que envolve a tecnologia digital em todas as suas frentes, ou seja, a hiperconectividade, com dados na nuvem e a internet das coisas.

“Em mais uma conquista pioneira, somos o primeiro fabricante de veículos comerciais a inaugurar uma linha de montagem de caminhões inovadora, rumo a Indústria 4.0, já estamos vivendo o futuro”, comemora PhilippSchiemer, presidente da Mercedes-Benz do Brasil & CEO America Latina. “Novamente estamos revolucionando a história da indústria automobilística brasileira.”

E o que o transportador ganha com isso? Muito, afirmam os especialistas. Principalmente pela obtenção e manutenção de altos padrões de qualidade e produtividade, isso sem falar de uma flexibilidade para atendimento às demandas dos clientes que jamais existiu. Até agora, alterar algum procedimento da linha de montagem era um bicho de sete cabeças e que exigia o envolvimento de muita gente.

Fruto de um investimento de R$ 500 milhões, a mais moderna fábrica Mercedes-Benz do mundo exibe conceitos únicos dentro do mundo automobilístico e que atingirão para todos os processos produtivos da empresa. Desde as linhas de motores, câmbios e eixos até a fabricação de chassis de ônibus e a fábrica de Juiz de Fora, onde são produzidas as cabinas e as caminhões Actros. O investimento total chega a R$ 2,4 bilhões até 2022.

A produção conectada traz reflexos imediatos ao ambiente industrial, desde a fabricação limpa, sem qualquer excesso ao longo da linha, um Just in time, digamos, folgado e, graças à observação extensiva dos pontos críticos da linha ao longo dos anos, uma velocidade de montagem muito maior.

O próprio Schiemer informa que a nova linha de montagem registra ganhos de 15% na eficiência em comparação com a linha anterior. “Alcançaremos também 20% de ganho de eficiência logística”, anuncia o presidente.

Para se ter ideia da extensão dos benefícios da nova linha de montagem, no suporte aos seu funcionamento, houve uma redução de 53 para 6 do número de armazéns de peças, enquanto o percentual de entrega de peças diretas aumentou de 20 para 45%. Reflexo disso, o armazenamento de componentes reduziu de 10 para no máximo 3 dias.

Ganhos também tiveram os funcionários da linha de montagem. Graças à sua participação na concepção do ambiente de trabalho, todos os equipamentos e ferramentas utilizadas pelo pessoal oferecem os mais modernos conceitos de ergonomia e segurança, o que além de elevar sobremaneira a produtividade, também aumenta, e muito, a qualidade de vida dos colaboradores no trabalho.

Com o conhecimento de todas as áreas de estrangulamento também foi possível conceber soluções para eliminar esses pontos. Num dos pontos de grande trabalho de fixação de partes às longarinas, por exemplo, a linha de montagem única é espalhada em quatro pistas, de maneira manter o ritmo de montagem além do ponto. Pouco antes desse trecho, uma zona de armazenagem foi racionalizada com a instalação de um “supermercado” e um estoque, facilmente acessíveis.

Aspecto que também chama atenção é a diversidade de equipamentos, ferramentas e tecnologias de última geração totalmente conectadas, o que possibilitando detectar e corrigir qualquer anomalia no circuito. Os dados são disponibilizados em tempo real para diversas áreas da fábrica.

Um avançado recurso tecnológico é um App móvel que permite acompanhar 100% da produção da nova linha pelo celular, uma ferramenta que tem interface com a planta de Juiz de Fora e várias áreas dentro da fábrica de São Bernardo do Campo e em breve de outras fábricas do grupo no mundo.

Carlos Santiago, vice-presidente de Operações da Mercedes-Benz do Brasil, explica como funciona o sistema: “Todos os dados gerados pelo aplicativo e por equipamento como as apertadeiras eletrônicas e os AGVs – Veículos Guiados Automaticamente, são armazenados na nuvem com a inteligência do Big Data”.

Assim, os técnicos da Mercedes-Benz utilizam os recursos Analytics e podem monitorar a qualidade de todos os produtos, detectar qualquer falha e combinar as informações de vendas com os sistemas de produção para flexibilizar o mix de produtos na linha.

Aliás, mais de 60 AGVs trabalham ao longo da linha, além de 100 apertadeiras eletrônicas, mais de 40 monitores de tevê que dispensam papéis para orientar os montadores em cada estação de trabalho e modernas impressoras 3D também estão instaladas. Em breve, adianta Santiago, óculos de realidade aumentada auxiliarão a montagem, na consulta de manuais ou especificidades de um cliente.

Os cuidados estão em todos os detalhes. No que diz respeito à logística de peças, empilhadeiras com câmera orientam toda a movimentação e sensores luminosos nas prateleiras de estoque monitoram a entrada e saída dos materiais.

A nova fabrica segue o conceito “Oneroofassembly”, onde todos os modelos de caminhões podem ser produzidos no mesmo prédio e com total flexibilidade na ordem de montagem, independente da categoria.

Outro conceito seguido é o “Fishbone” que levou à instalação de estoque e supermercado de peças, pré-montagem e montagem final, perfeitamente integrados, atingindo a otimização dos tempos de montagem, qualidade final do produto e perda praticamente zero.

Da mesma forma, a unificação e verticalização dos almoxarifados possibilita a centralização do recebimento, distribuição e devolução de embalagens vazias, produzindo redução dos custos logísticos e de transporte.

Assim, os 50 armazéns anteriores resumem-se agora em seis Hubs Logísticos integrados à linha de montagem, cada um de3les próximo a um centro de produção. Resultado: melhorias na ergonomia e na segurança dos funcionários, maior rapidez e agilidade no processo.  

Esses Hubs têm 12 metros de altura e são operados pelas empilhadeiras que contam com câmera para visualização, enquanto sistemas TI controlam automaticamente a entrada e saída dos materiais.

A economia não se limitou à linha propriamente dita, houve uma redução de nada menos que 56% no consumo de energia, graças ao uso de lâmpadas de Led em 100% das instalações.

A indústria 4.0 não apenas influenciou a instalação da nova linha de montagem de São Bernardo do Campo, mas também inspirou o projeto da pista de testes de Iracemápolis.  

Os números são estratosféricos, envolvendo investimentos da ordem de R$ 90 milhões, pistas que somam 12 quilômetros de extensão, 840 blocos de concreto que simulam os mais variados tipos de topografia e área total de 1,3 milhão de m² no interior do Estado de São Paulo.

O campo de provas da Mercedes-Benz em Iracemapolis, SP, é o maior e mais moderno da América Latina e Cone Sul, mas é totalmente independente da fábrica de automóveis da montadora alemã vizinha a área de testes. “O campo integra pistas de testes de durabilidade, acústica e terra e introduz a empresa na era da engenharia 4.0 também neste segmento”, diz orgulhoso Phillipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz do Brasil.

A tecnologia ali usada possibilita que cada quilômetro rodado em suas pistas equivale a 60 km rodados em vias comuns, o que representa um grande ganho de tempo no desenvolvimento de novos produtos e na experimentação para melhoria contínua dos produtos da montadora.

Com 16 pistas à disposição, 14 para examinar as reações às mais severas aplicações e 2 para especificidades como o conforto acústico e o térmico, o campo de provas inclui uma infraestrutura de conectividade ligada aos centros mundiais de desenvolvimento da montadora.

A tecnologia utilizada é a DriverGuidance System – Sistema de Referência de Condução, uma solução que permite que os departamentos de engenharia possam acompanhar remotamente os testes em tempo real. Conceito também utilizado na linha de montagem de São Bernardo do Campo.

Para se ter ideia da importância da inauguração do Campo de Provas de Iracemápolis, os 840 blocos de concreto utilizados na montagem das vias são exatamente iguais em número e design de igual quantidade usadas na construção dos campos de Wörth, na Alemanha, e de Madras, nos Estados Unidos, as bases de desenvolvimento da companhia nos continentes Europeu, America do Norte e America Latina.

“O que queremos são soluções mais customizadas e ainda mais adequadas ainda para segmentos específicos, de maneira que consigamos montar veículos comerciais que apresentam o menor custo operacional possível e a maior rentabilidade para os empresários”, explica Schiemer.

O dr.Christof Weber, vice-presidente de Desenvolvimento de Caminhões & Agregados da Mercedes-Benz do Brasil, observa que o Brasil, pelas suas próprias características, é referencia em testes de robustez e aprovados para o mundo todo. “O Brasil passa a fazer parte do circulo de desenvolvimento mundial da Daimler para os segmentos de caminhões, ônibus e comerciais leves.”

Para o especialista, até hoje os testes de desenvolvimento envolviam 50 mil quilômetros de rodagem, mas, a partir de agora, só precisarão de um terço disso. “Chegamos à sofisticação de contar com pistas para homologação e testes de conforto, tanto acústico como térmico”, comemora.

O grande diferencial é que todos os testes e de cada veículo são acompanhados em tempo real por qualquer das pistas de testes citadas, com um ganho de qualidade extremamente alto.

Para a engenharia, contar com um campo de provas igual é o melhor dos mundos. Camilo Adas, gerente sênior de Desenvolvimento de Produto da Mercedes-Benz do Brasil, destaca que a precisão seguida pelo ferramental disponível é de refinamento militar: “Para se ter ideia nosso acompanhamento por GPS tem uma precisão de 2 centímetros.”

“Com isso – adiciona Schiemer -, nossos clientes vão contar com veículos com uma homogeneidade e qualidade muito grande e que, seguramente, apresentarão um índice de disponibilidade muito grande para o transportador.”

A própria concepção do campo de provas foi especial. Um caminhão laboratório equipado com 260 sensores rodou mais de 16 mil quilômetros em todos os tipos de pisos e situações no território brasileiro e países vizinhos. Segundo Adas, o cavalo-mecânico laboratório tem um custo de 1 milhão de Euros.

O objetivo foi a captação de dados reais da severidade das nossas estradas para servir de modelo de traçado das pistas. A reprodução do ambiente real em área segregada possibilita testes 24 horas, se necessários, e um achatamento do tempo de desenvolvimento de novos produtos em um terço do tempo.

 

Texto:  Pedro Bartolomeu